Em Kardec e em Emmanuel
Orson Peter Carrara orsonpeter92@gmail.com
Recordamos
as duas notáveis personalidades para destacar um dos aspectos mais importantes
do pensamento espírita. Como se sabe, o tríplice aspecto da Doutrina Espírita:
Ciência, Filosofia e Religião, têm sido, muitas vezes, motivo de polêmicas e
discussões inúteis. Especialmente, quando se trata sobre o caráter religioso do
Espiritismo. Estão esquecidos os protagonistas de defesas exclusivas do aspecto
científico em detrimento do aspecto religioso, da existência desse tríplice
aspecto, tão claro para os que estudam o Espiritismo. Verdadeiramente
causaremos enorme prejuízo ao entendimento doutrinário dos postulados
espíritas, se desejarmos excluir ou mesmo marginalizar o fundamental aspecto da
moral religiosa em nossos estudos, reflexões e esforços para divulgação do
Espiritismo.
Kardec
abordou a temática muitas vezes e Emmanuel. Espírito, entre outros autores, se
postou firme em defesa do aspecto religioso de nossa incomparável Doutrina
Espírita. Claro que ela tem embasamento científico, desdobramentos filosóficos
e, não há qualquer dúvida, suas inevitáveis consequências religiosas. Como
negar isso?
No
livro Emmanuel, do Espírito Emmanuel,
na psicografia de Chico Xavier, e de edição da FEB. Diz o nobre benfeitor em
seu capítulo IV, com o significativo título
A Base Religiosa:
“No futuro, viverá a humanidade fora
desse ambiente de animosidade entre a ciência e a religião e julgo mesmo que em
nenhuma civilização pode a primeira substituir a segunda. Uma e outra se
completam no processo de evolução de todas as almas para o Criador (...). As
suas aparentes antinomias, que derivam, na atualidade, da compreensão
deficiente do homem, em face dos problemas transcendentes da vida, serão
eliminadas, dentro do estudo, da análise e do raciocínio. (...)”
Destaco
pequenos trechos do valioso capítulo e peço ao leitor consultá-lo na íntegra.
Parece que estamos esquecidos de tão importantes reflexões. No subtítulo
seguinte O Tóxico do Intelectualismo,
pondera o autor espiritual:
“Nos tempos modernos, mentalidades
existem que pugnam pelo desaparecimento das noções religiosas do coração dos
homens, saturadas do cientificismo do século e trabalhadas por ideias
excêntricas, sem perceberem as graves responsabilidades dos seus labores
intelectuais, porquanto hão de colher o fruto amargo das sementes que plantaram nas almas jovens e indecisas. (...)”.
E
prossegue no que podemos considerar autêntica advertência:
“Pede-se uma educação sem Deus, o
aniquilamento da fé, o afastamento das esperanças numa outra vida, a morte da
crença nos poderes de uma providência estranha aos homens. Essa tarefa é
inútil. Os que se abalançam a sugerir semelhantes empresas podem ser dignos de
respeito e admiração, quando se destacam por seus méritos científicos, mas
assemelham-se a alguém que tivesse a fortuna de obter um oásis entre imensos
desertos. Confortados e satisfeitos em na sua felicidade ocasional, não vêem as
caravanas inumeráveis de infelizes,
cheias de sede e fome, transitando sobre as areias ardentes. (...)”
Claro,
é fácil descartar o aspecto da moral religiosa, que inclui a fé – ainda que em
diferentes manifestações na cultura popular – quando estamos satisfeitos
materialmente.
E pondera nos tópicos
seguintes, que peço ao leitor consultar na íntegra, face à claridade de suas
expressões:
“O sentimento religioso é a base de
todas as civilizações. Preconiza-se uma educação pela inteligência,
concedendo-se liberdade aos impulsos naturais do homem. A experiência
fracassaria. É ocioso acrescentar que me refiro aqui à moral religiosa, que deverá inspirar a formação do caráter e do
instituto da família e não ao sectarismo do círculo estreito das igrejas
terrestres, que costumam envenenar, aí no mundo, o ambiente das escolas
públicas, onde deverá prevalecer sempre o mais largo critério de liberdade do
pensamento. (...)
Sobre
a falibilidade humana, diz o conhecido Espírito:
“Em cada século o progresso científico
renova a sua concepção acerca dos mais importantes problemas da vida. Raramente
os verdadeiros sábios são compreendidos por seus contemporâneos. Se as
contradições dos estudiosos são o sinal de que a Ciência evolve sempre, elas
atestam, igualmente, a fraqueza e inconsistência dos seus conhecimentos e a
falibilidade humana.”
E
conclui com farto material para nossa reflexão:
“Diz-se que o pensamento religioso é
uma ilusão. Tal afirmativa carece de fundamento. Nenhuma teoria científica,
nenhum sistema político, nenhum programa de reeducação pode roubar do mundo a
ideia de Deus e da imortalidade do ser, inatas no coração dos homens. (...) A
religião viverá entre as criaturas, instruindo e consolando, como um sublime legado. (...) O que se
faz preciso, em vossa época, é estabelecer a diferença entre religião e
religiões. A religião é o sentimento
divino que prende o homem ao Criador. As religiões são organizações dos
homens, falíveis e imperfeitas como eles próprios (...).
Mas
busquemos Kardec. É na Conclusão de O Livro dos Espíritos, item V, que
afirma o Codificador em meio a importantes considerações: “(...) O Espiritismo
é forte porque ele se apóia sobre as próprias bases da Religião (...)”. E no
item VII, comentando os efeitos sobre os que compreendem o Espiritismo, comenta
com muita propriedade: “(...) o primeiro, e o mais geral, é desenvolver o
sentimento religioso (...)”.
Não
é preciso continuar. Tais transcrições desdobram estudos amplos e oportunidades
valiosas de raciocínio, entre outras tantas disponíveis no pensamento de Kardec
e no ensino dos Espíritos. É verdade que a palavra religião sofreu desgastes,
mas isso não invalida, de forma alguma, sua extrema utilidade na vida humana,
os benefícios que espalha, as lúcidas orientações que oferece a tanta gente,
independente de crença. Como vamos desprezar isso, como desconsiderar aspecto
tão genuíno tão marcante na própria índole do Espiritismo? Afinal o próprio
Kardec afirmou na Revista Espírita, de dezembro de 1868, que “A caridade é a
alma do Espiritismo”. Caridade que também é ciência e filosofia, mas
essencialmente é originária da moral
relig
Estamos
perdendo muito tempo com discussões inúteis, que só desviam de foco a proposta
viva de renovação moral trazida pelo Espiritismo. Ninguém deverá desprezar a
Ciência, como o próprio Kardec propôs, mas igualmente não deveremos desprezar a
Religião e a Filosofia, aspectos inseparáveis do magnífico Pentateuco Espírita.
Será
muito oportuno, para o tema, relermos a Conclusão
de O Livro dos Espíritos, na íntegra
e com a devida atenção que o assunto requer.
Nota: os trechos em negrito são de
destaque do autor da matéria.