Vingativo não declarado
por Orson Peter Carrara
A
psicanalista Maria Rita Kehl, em seu livro Ressentimento: clínica psicanalítica, edição da Casa do Psicólogo, analisando a temática do ressentimento,
com muita propriedade informa que o ressentido é um vingativo não
declarado. Em seu valioso texto,
encontramos, à página 91 que “O ressentido é um escravo de sua impossibilidade de
esquecer. Vive em função de sua vingança adiada, de modo que em sua vida não é
possível abrir lugar para o novo”.
Interessante
pensar no vingativo não declarado ou
na expressão vingança adiada. Isso lembra a significação do termo em
dicionário. Suas definições indicam: lembrança magoada de ofensa recebida,
ofender-se, tornar a sentir, ressentir com mágoa. A grande questão está mesmo
na mágoa guardada. Esta gera doenças, provoca tensões, desequilibra a mente e o
corpo.
Esse
guardar da mágoa, que aguarda oportunidade de vomitar sentimentos lesados leva
a pensar na importância do perdão. Sim, o velho perdão! É que quem perdoa
liberta-se, tira quilos de tensões dos ombros, solta-se, readquire o
equilíbrio.
Imaginemos,
contudo, o que se passa com quem se sente ofendido. A sensação de lesão
interior, de humilhação recebida, de desconsideração, na verdade um sentimento
de sentir-se menor, desconsiderado, humilhado. Mas isso pode ser vencido. Basta
pensar que ninguém é maior do que ninguém, nem menor. Somos todos iguais, na
origem e na destinação, todos capazes de superar adversidades e igualmente usar
a incrível potencialidade humana presente em todos nós.
Pergunto,
pois, por que entregar-se ao medo, às angústias, à sensação de abandono ou
desprezo diante das adversidades? Por que permitir-se tristezas prolongadas,
abatimentos que levam à depressão ou desânimos, se a vida conspira a nosso
favor?
A vida
é muito valiosa para ser desprezada, desrespeitada. Como permitir-se perder
tempo com supostas ofensas recebidas (e digo supostas porque na verdade, a
ofensa é do ofendido, não do ofensor = este não sabe o que faz e vive um drama
interior para ofender) e com o acumular de mágoas e ressentimentos?
A vida
é muito valiosa, conspira a nosso favor, para ficarmos focados em opiniões
desequilibradas, de momentos infelizes, quando há tanto o que fazer, a crescer
em moral e intelecto. Ergamos, pois, a cabeça, e esqueçamos agressões.
Prossigamos trabalhando, confiando, fazendo o melhor ao nosso alcance e
estaremos inalcançáveis das agressões. Se superarmos as bobagens da vaidade,
das pretensões, e especialmente a tendência de sentir-se “coitadinho” ou
dependentes de aprovações.
Magoar-se
ou ficar ressentido é valorizar o desequilíbrio alheio. Melhor prosseguir
adiante, esquecendo essas bobagens que causam doenças e desequilibram a mente,
muitas vezes desviando-nos de objetivos essências para a própria felicidade.
Querido Orson,
ResponderExcluirGostei muito do texto. De fato esse livro é realmente interessante e suas considerações pertinentes. Porém, a meu ver,nem sempre a ofensa causada é uma bobagem e esquecer se torna algo bem complicado quando as consequências da atitude do ofensor são impactantes e persistentes na vida do ofendido. Não acredito que o perdão seja possível através do esquecimento. Como esquecer o assassinato de um filho ou uma separação envolvendo traição, ou uma lesão financeira grave enquanto as consequências continuam a prejudicar e lesar? Sem dúvida permanecer preso na dor aguardando reparação, esperando para ver a justiça divina em ação é escolher atar-se. Por outro lado há provas na vida que poucos conseguem sofrer bem, transformar a dor em crescimento porque não é algo tão simples.
Um abraço
Bia
Abraços ao caro Orson por mais este belo texto!
ResponderExcluirDomingos