Centenário importante

 



Centenário de Gênese da Alma

Orson Peter Carrara 

 

As datas comemorativas não devem ser esquecidas. Essas efemérides reforçam os ideais, estimulam o conhecimento às gerações mais novas e especialmente resgatam esforços e histórias de pioneiros em todas as áreas do conhecimento e da atuação humana.

A história, em sua generalidade, é pródiga em bons conteúdos, apesar dos equívocos que ocorrem igualmente por força da fragilidade humana. E, claro, as ações e conquistas formam o acervo de experiências – acumuladas do passado – que hoje desfrutamos.

Matão, cidade interiorana do estado de São Paulo, como todas as demais – capitais ou cidades de menor porte – construíram sua história, onde seu mais ilustre cidadão imortalizou os esforços em prol da divulgação e vivência da Doutrina Espírita. A expressão “ilustre cidadão” se justifica por si só, face às ações humanitárias empreendidas por Cairbar Schutel, mesmo antes de se tornar espírita, quando a então vila transformou-se em município independente e ele assumiu as funções que hoje correspondem a de prefeito. Isso tudo sem dizer de iniciativas sociais bem conhecidas de sua biografia.

Ativo escritor, Schutel deixou legado importante de suas reflexões e estudos em diversas obras, mais de uma dezena, que continuam sendo editadas. Dentre elas, mais uma atinge o marco de um centenário de publicação: Gênese da Alma, publicada originariamente em 1924. Importante obra de seu acervo, não pode ficar esquecida. E a comemoração desses 100 anos de publicação estimula novamente seu conhecimento e divulgação. Um fato histórico!

Com dezenas de capítulos, o autor afirma na introdução que ele classificou como Breve Explicação, no primeiro parágrafo:

“O único intuito deste livro é demonstrar, com bases sólidas, fatos verificados e verificáveis; e, com argumentos irrefutáveis, a Imortalidade da Alma e, portanto, a Vida Eterna. (...)”

 

Note-se as expressões do trecho curto transcrito: “bases sólidas, fatos verificados e verificáveis, e, com argumentos irrefutáveis”. Isso para demonstrar a Imortalidade da alma, objetivo da obra. Que determinação admirável! E como o próprio título da obra indica, a preocupação é esclarecer, à luz do Espiritismo – como ele tão bem destaca no texto introdutório – a origem ou desenvolvimento dos seres. E para isso considera que “(...) era nosso dever traçar as linhas gerais da evolução, a começar do ponto em que se nos mostra o princípio anímico, embora em seu período embrionário (...)”.

A sequencia dos capítulos vai desmembrar essa preocupação do autor, que se sucedem racionalmente para aquele objetivo.

Já no primeiro capítulo ele evoca a velha questão da polêmica entre as diferenças do reino animal e hominal. A própria editora, ao divulgar a obra, vale-se desse precioso trecho: “O orgulho humano cavou um abismo intransponível entre o reino hominal e o reino animal. A falta de estudo, de observação, e a ignorância presunçosa permitiram o destaque do homem, classificando-o como ser à parte da Criação. A alma não poderia deixar de ter o seu começo, o seu nascimento no reino animal, nos seres da criação, onde passou por todas as transformações indispensáveis ao seu progresso. Sendo a imortalidade da alma uma lei natural, este livro mostra também que os animais sobrevivem à morte do corpo físico, conservando suas individualidades. Mostra que não há o que não está submetido à Lei da Evolução, decretada pelos desígnios de Deus. (...)”.

 

É expressamente importante manter nos dias atuais, à luz de tantas conquistas das ciências em geral, a reflexão de que – até pela lógica da magnífica informação acima constante: “A alma não poderia deixar de ter o seu começo, o seu nascimento no reino animal, nos seres da criação, onde passou por todas as transformações indispensáveis ao seu progresso.”. Nada mais natural, nada mais lógico.

E é a partir dessas reflexões que o autor desenvolve seu livro, trazendo ao leitor capítulos notáveis, referindo-se a insetos, cães, gatos, e mesmo animais selvagens, traduzindo importantes considerações sobre a evolução. Inclusive não esqueceu de citar Darwin em capítulo específico.

Mas capítulos como O berço da alma, A inteligência e o instinto, O raciocínio e a memória, Alma dos animais, Manifestações póstumas dos animais, Os cães da Cruz Vermelha, para aqui destacar apenas alguns do extraordinário livro, empolgam pela didática e pela objetividade, bem como, é claro, pela lucidez do autor. Tudo para trazer ao leitor a lógica dos princípios espíritas tão bem expostos pelo O Livro dos Espíritos. Sem qualquer receio podemos considerar Gênese da Alma como autêntico complemento à Codificação, pelo desdobramento natural da informação que se amplia.

Propositalmente, porém, destacamos ainda os capítulos – já no final da obra – que se caracterizam por grande base de entendimento da questão da imortalidade da alma, objetivo do livro: A Revelação Progressiva, A Doutrina da Imortalidade, Prova da imortalidade da alma pela fotografia e Prova da Imortalidade da Alma. É nesse capítulo Prova da Imortalidade da Alma que o autor lança o desafio ao raciocínio do leitor:

 

“(...) As materializações, as moldagens, as fotografias, a voz direta, a escrita direta e os fatos que se dão com o auxílio dos médiuns aí estão para confirmarem a sobrevivência do Espírito: Que outra explicação plausível se poderia dar desses fatos maravilhosos? Qual a causa a que se podem atribuir esses fenômenos, todos de natureza espiritual, inteligentes, e cujos efeitos denotam critério, raciocínio, a execução de um plano sabiamente formulado, a manifestação da vontade pela força que molda a matéria, dando-lhe as formas precisas de funcionamento? O critério sadio proclama os fatos espíritas como provas patentes da Imortalidade! (...)”

 

Aí está uma indagação de profundidade, citando várias modalidades de fenômenos, que convida à uma análise racional, imparcial, como o fez Allan Kardec. Cairbar valeu-se da fundamentação sólida dos argumentos e método científico da observação do Codificador para, da mesma forma, também investigar e concluir da realidade dos fenômenos produzidos pelos espíritos por meio dos chamados médiuns. E dada a variedade de estágios evolutivos em que se encontram esses comunicantes – expondo claramente que não são iguais nem em saber, nem em maturidade, nem mesmo em moralidade ou experiência ou habilidades – abre-se a perspectiva desse início de evolução da alma, daí a Gênese da Alma, que Schutel presenteou aos leitores.

Vale ressaltar que o autor matonense, nos idos de 1924, utilizou-se das obras da Codificação Espírita de Allan Kardec para desenvolver e tornar públicas suas reflexões em forma de livros que publicou e artigos apresentados pelas suas conhecidas publicações. Isso mostra coerência, solidez, lógica. Que não são ultrapassadas, pois que não inventadas ou imaginas, mas fruto da observação atenta, a conclusão por meio de experiências racionais.

 

Mas como estamos homenageando aqui o centenário de um dos livros de Cairbar, não podemos nos esquecer que é neste memorável trabalho que está o capítulo Apelo em favor dos animais. Comovente página que sensibilizou toda uma plateia em Matão – por ocasião do evento comemorativo do centenário do jornal O Clarim, em 2005 – e depois popularizou-se pelos meios virtuais, quando a respeitada palestrante e escritora espírita Dra. Irvênia Prada (médica veterinária formada pela USP, com extensa carreira acadêmica), ao final de sua palestra faz uma leitura parcial do precioso capítulo. O pequeno vídeo de apenas três minutos pode ser encontrado digitando-se na pesquisa virtual o título: Apelo pelos animais ou Apelo em favor dos animais, pesquisando em vídeos pelo face ou pelo youtube.

 

Eis, pois, uma boa dica de leitura em 2024, no ano do centenário de Gênese da Alma. A obra continua disponível, agora em nova paginação e capa. Ainda que não tenhamos, no livro, a indicação de dia e mês de lançamento, foi em 1924 que veio a lume. Nossa gratidão, uma vez mais, ao grande nome da história do Espiritismo no Brasil.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


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