Somos mesmo distraídos


por Orson Peter Carrara
            Passamos a vida e não percebemos. É incrível a distração que nos caracteriza o comportamento humano. Depois reclamamos, numa tremenda incoerência. Ficamos doentes e não sabemos a razão; as circunstâncias ficam difíceis e não percebemos que somos a causa... É, infelizmente, é verdade. Somos nós mesmos os causadores das situações que vamos vivenciando, de dificuldades, doenças, perturbações, neuroses e adversidades próprias de nossa condição humana. Acompanhe comigo.
            Mantemos a intriga, alimentamos o pessimismo, reclamamos de tudo, usamos a calúnia e a maledicência, sem nos preocupar. Criticamos, criamos resistência para tudo, complicamos as circunstâncias com nossa rebeldia; pior: somos teimosos e ranhetas, usamos muito a inconformidade, não temos paciência e raramente usamos a alegria. Irritação, pressa, precipitação, palavrões, violência física e verbal nos caracteriza de maneira expressiva. E há agravantes: queremos ganhar sempre, não aceitamos o fracasso, nos consideramos melhores do que os outros; julgamos que temos preferência e ainda acusamos a vida; vez por outra corrompemos, usamos a desonestidade, tornamo-nos omissos e indiferentes e ainda atacamos com crueldade aqueles que se colocam a algo fazer.  E, pasmem, nos damos o direito de odiar???!!!
            Nem é preciso continuar, não é leitor?  São as nossas características humanas. Exagero? Não! Somos assim, os seres humanos. Visão pessimista? Também não, pois que é uma visão geral que contrasta com exemplos de dedicação, bondade, desprendimento, renúncia e perseverança sem interesse. Quanta gente consciente, honesta e cativante, que distribui esperança e trabalha no bem, em todas as áreas.
            O que queremos destacar na verdade é que aqueles que estão equilibrados, que julgamos os felizes – e realmente estão – são aqueles que  conseguiram disciplinar o próprio comportamento; são os que domaram os ímpetos de violência e egoísmo. São também os que aprenderam a calar no momento certo, os que sabem esperar, os que nunca acusam e compreendem. São também os que usam a alegria de viver e a esperança como combustível diário na superação das próprias adversidades. São os que confiam na vida, sintonizam com os valores espirituais – estejam eles na religião que estiverem – e adotaram a tolerância e a compreensão como normas de comportamento. São sábios, já aprenderam a viver.
            Os que reclamam, acusam, xingam, os inconformados revoltados, os que roubam, corrompem, agridem, violentam, estão agredindo a si mesmos. É lei que toda lesão que causamos a nós mesmos e ao próximo teremos que reparar perante a própria consciência, mais cedo ou mais tarde. Por adotarem tais padrões de conduta é que tudo lhes dá errado, que nada dá certo ou que se agravam as dificuldades e as doenças.
            E nós continuamos distraídos não percebendo as lições vivas que ombreiam conosco diariamente.  Não percebemos a própria dinâmica da vida, que conspira a nosso favor e preferimos a acomodação ou a revolta.  Afastamo-nos de Deus. Sim, muitos de nós usamos a religião como refúgio, esquecendo a religiosidade, nos momentos de dificuldades, esquecendo-se que ela é alimento para alma.
            Já não é hora de voltarmos nossa atenção para os valores que ficam? Poder, posse, cargo, nome, recursos materiais, saúde, juventude, tudo isso passa. O que fica é o patrimônio moral que acumulamos. Quando é que vamos sair dessa distração ilusória?