Por que lamentar-se?

Orson Peter Carrara
Deus criou o homem ativo, inteligente e livre,
E o fez artífice de seu próprio destino.
Abriu diante dele dois caminhos que pode seguir:
Um vai para o mal e o outro para o bem.
O primeiro dos dois é doce em aparência;
Para segui-lo não é preciso nenhum penoso esforço:
Sem estudo nem cuidados, viver na indolência,
Aos seus instintos brutais deixar um livre vôo,
Eis tudo o que é preciso.
– O segundo, ao contrário,
Quer constantes esforços, um trabalho nobre,
E os cuidados vigilantes, e a procura austera,
A razão liberta e o instinto contido.
O homem, livre em sua escolha, pode tomar o primeiro,
Corromper-se na ignorância e na imoralidade;
Preferir ao dever a paixão grosseira,
À razão, o instinto e a brutalidade.
Ou então pode, ouvindo com interesse dócil
A voz que lhe diz: “Fostes feito para crescer,
Para progredir e não para ficar imóvel.”
No segundo entrar cheio de um nobre desejo.
Segundo o que decide ver seu destino
Sombrio se desenrolar sob seu olhar desvairado,
Ou então lhe sorrindo como a noiva
Sorri ao homem feliz a quem o seu coração é devido.
Mas se fazeis o mal, podereis neste mundo
A riqueza adquirir, os títulos, as honras;
Mas a calma da alma, e essa alegria profunda
Que nasce dos santos desejos e alegra os corações
Desaparecerão para sempre; e do remorso pungente,
Vos perseguirá a voz no meio dos festins,
Misturando para perturbá-los sua nota discordante
Aos vossos cantos de triunfo, aos vossos alegres estribilhos.
Depois, quando tiver soado para vós a hora fatal,
Quando o Espírito se livra do corpo que o enclausurava,
Entrará de novo na esfera moral
Onde a verdade brilha e o erro desaparece,
Onde o sofisma impuro, a frouxa hipocrisia
Não acham nunca acesso, onde tudo é luminoso,
Fantasma acusador, vosso culposo caminho
Surgirá diante de vós para vos seguir em todos os lugares.
Vossos crimes tornar-se-ão vossos carrascos, e vós, rico,
Sentir-vos-eis nu; poderoso, abandonado;
Fugireis espantados, tremendo como a corça.
Foge diante do caçador em sua perda obstinado.
Talvez que ébrio, então, de orgulho e de sofrimento,
A Deus soltareis um grito blasfemador,
Acusando-o de vossos males; mas vossa consciência
Poderosa elevará este outro grito vingador:
“Cessa de blasfemar, homem, em tua demência.
Quando Deus te criou livre, ativo, inteligente,
Só para ti no mundo limitou seu poder,
E de tua própria sorte te fez o artífice.
Tua vontade basta para transformar em alegria
O mal que sentes. Contempla, radioso,
Aquele que do dever segue o santo caminho,
Que luta, que vence, e que conquista os céus.
Por preço do mesmo esforço, a mesma recompensa
Te espera. – Por que te lamentar então? Reconsidera-te.
Desse Deus justo e bom implora a assistência;
Trabalha, luta, ora, e o céu está em ti.”


Nota do articulista: na poesia do amigo anônimo,
um alerta à nossa consciência.