Um menino de dez anos
Orson Peter Carrara
Enquanto
os pais assistiam ao show musical, acomodados no grande salão do belo teatro, o
garoto de apenas dez anos estava no banheiro “aprontando”. Ele simplesmente
“socou” vários rolos de papel higiênico nos vasos sanitários, entupiu os ralos
do chão e das pias com o mesmo papel picadinho e saiu deixando todas as
torneiras abertas.
O
resultado não se fez esperar. Em breve tempo a água invadiu o espaço todo que
dava acesso aos sanitários, surpreendendo o público e funcionários na saída do
show.
O
autor da “arte” não foi descoberto no momento. A mãe veio me contar
posteriormente porque o garoto, ouvindo minha palestra sobre minha timidez na
infância e adolescência, quis conversar comigo. Disse-me ele do enfrentamento
com os colegas na sala de aula, que o atormentam – segundo sua versão –, razão
pela qual identificou-se com a minha fala. Durante nossa conversa,
transmiti-lhe otimismo, pedi-lhe que não reagisse às provocações, abracei-o e o
estimulei ao bom comportamento. Mas eu ainda não sabia do episódio do teatro.
Depois
juntei as peças. O garoto, como qualquer criança da sua idade, ainda não tem
noção exata, nem maturidade para muitas situações, embora saibam bem as
crianças dessa idade o que é certo e o que é errado. Mas o episódio do
banheiro, ainda que sendo uma aventura irresponsável com evidentes prejuízos, é
também uma explosão de agressão às dificuldades próprias dos embates da idade
nos confrontos com colegas da mesma faixa etária.
Sentindo-se
acuado, pressionado, a reação vai se apresentar de alguma forma, até para
chamar a atenção.
Os
psicólogos tem melhores condições do que eu para bem definir tais situações e
até sugestões para atenuar essas crises e reações internas que não estão apenas
na infância, mas também na idade adulta. Quantos adultos que agem como crianças
mimadas!
Mas
o fato é que, percebendo os pais tais dificuldades, a ajuda e apoio precisam
aparecer, para não piorar a situação.
O
diálogo, a presença carinhosa ao invés de punitiva, o exemplo de companheirismo
e compreensão e as orientações de pais e educadores e até mesmo a terapia
psicológica são de grande valia para alteração do quadro.
A
frequência ao templo religioso, com as práticas próprias de cada religião e
mesmo a prece em casa, são recursos preciosos para acalmar esses ímpetos
desagradáveis que ocorrem com nossas crianças. E, claro, a mudança para melhor
no comportamento dos adultos.
O
fato final é que pais e educadores não podem ignorar tais ocorrências. As
crianças trazem consigo seus traumas e dificuldades e precisam da orientação e
ajuda dos adultos. Nem sempre conseguem entender e superar os enfrentamentos
que a vida vai trazendo.
Como
ignorar isso? Por omissão desse quadro é que estamos tendo tantos adultos e
jovens desequilibrados promovendo tantas tragédias no cotidiano da vida humana.
É
pela nossa indiferença em casa também que muitos de nossos jovens adentram o
perigoso caminho das drogas e se deixam arrastar pela violência. Existem, é
claro, outras causas e também não podemos generalizar, mas os filhos precisam
do carinho dos pais e seus educadores e o grande desafio é que esse carinho não
pode ser castrador nem liberal demais. O equilíbrio entre os dois pontos é o
grande desafio para os pais.
Falar
para eles, desde tenra idade, da bondade de Deus para conosco, do respeito aos
animais, ao patrimônio público, aos mais velhos, às instituições, aos
professores; ensinar-lhes a orar, falar-lhes diretamente ao coração – com
exemplos – do Evangelho do Cristo é vacina certa e indicada que evita o adulto
ou o jovem desequilibrado dos anos futuros.
Essa
semeadura prudente evita o egoísmo feroz que caracteriza a sociedade moderna,
geradora de tanta violência e desrespeito ou indiferença para com a vida. A
gratidão, a alegria de viver, a honestidade, a coragem, a determinação e a fé
são valores que os pais e educadores nunca devem desistir de transmitir às
novas gerações.
Basta
pensar que nunca esquecemos as lições de honestidade que recebemos de nossos
pais. Nunca esqueceremos os exemplos de dignidade, perseverança e trabalho que
semearam no ambiente doméstico e da fé ardente que nos transmitiram. Isso faz o
adulto consciente. As bagagens do adulto se formam na infância, sob influência
direta do adulto.
Estejamos,
pois, atentos, com nosso dever de educar!